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Hera, Io, e Argus

Mitologia Greco Romana

Certo dia, Hera notou que o dia escurecera de súbito e imediatamente desconfiou que o marido levantara uma nuvem para esconder algumas de suas façanhas que não gostava de expor à luz. Hera afatou a nuvem e viu o marido, à margem de um rio cristalino, com uma bela novilha ao seu lado. A rainha dos deuses desconfiou de que a aparência da novilha ocultava alguma bela ninfa de estirpe mortal, como, na verdade, era o cao. Tratava-se de Io, filha do rio-deus Ínaco, a quem Zeus cortejava, e a quem dera aquela forma ao sntir a aproximação de sua esposa.

Hera reuniu-se ao marido, e ao ver a novilha, fez louvores à sua beleza, e perguntou de quem se tratava, e de que rebanho era ela. Zeus para que ela parasse de fazer perguntas, respondeu que ela era uma criação recente da terra. Então, Hera lhe pediu que ela lhe fosse oferecida como presente. O que Zeus poderia fazer? Ele relutou em entregar a sua amante como presente para sua esposa; no entanto, como poderia ele recusar um presente tão insignificante tal como uma simples novilha? Ele não conseguiria, pois despertaria desconfianças; então, concordou. A deusa ainda não havia se livrado de todas as suspeitas; então, ela entregou a novilha aos cuidados de Argos, para que fosse vigiada constantemente.

Ora, Argos era um gigante com cem olhos na cabeça, e quando ele ia dormir nunca fechava mais do que dois olhos de cada vez, de modo que permanentemente ele mantinha vigilância sobre Io. Ele permitia que ela pastasse durante o dia, e à noite ele a amarrava impiedosamente com uma corda em torno do pescoço. Ela tinha vontade de estender os braços para implorar a Argos por sua liberdade, mas ela não possuía braços para estender, e sua voz era um mugido que até ela mesma se assustava. Ela via seu pai e suas irmãs, aproximava-se deles, e permitia que eles passassem a mão em suas costas, e ouvia quando eles comentavam sobre sua beleza. Seu pai apanhou para ela um punhado de grama, e ela lhe lambia as mãos que lhe eram estendidas. Ela desejava que ele a reconhecesse, e sentia vontade de externar-lhe o desejo; mas, ó infortúnio! faltava-lhem as palavras. Finalmente, ela considerou a hipótese de escrever algo, e grafou seu nome – era um nome curto – fazendo uso de seu casco nas areias. Ínaco a reconheceu, e descobrindo que sua filha, a quem ele há muito tempo vinha procurando, estava oculta sob tão singular disfarce, chorou sobre ela, e, abraçado ao seu pescoço branco, exclamou, "Que desgraça! minha filha, teria sido menos pesaroso jamais tê-la reencontrado!" Enquanto assim se lamentava, Argos, observava o entorno, e se aproximou, afastando-a para longe, e sentou-se sobre uma margem alta do rio, de onde ele podia vislumbrar tudo ao redor em todas as direções.

Zeus ficou preocupado ao contemplar o sofrimento da sua amada, e mandando chamar Hermes disse para ele que fosse e executasse Argos. Hermes se apressou, vestiu suas sandálias aladas nos pés, colocou o barrete na cabeça, pegou sua varinha mágica indutora de sonolência, e se lançou das torres celestiais para a terra. Ali chegando, pôs de lado duas asas, mantendo apenas sua varinha mágica, que ele havia presenteado a si mesmo como um pastor que chefia seu rebanho. E enquanto passeava ele tocava flauta. Esta flauta era também chamada de Flauta de Pã ou Flauta de Siringe. Argos ouvia embevecido, pois ele nunca tinha visto um instrumento como aquele. "Meu jovem," disse Argos, "vem e senta-te ao meu lado sobre esta rocha. Lugar melhor pelas redondezas não há como pasto para teu rebanho, e aqui encontrarás uma sombra agradável que os pastores apreciam muito." Hermes se sentou, conversou, e contou histórias até que ficou tarde, e tocou com sua flauta.

E antes que Hermes tivesse terminado suas histórias, ele percebeu que todos os olhos de Argos estavam se fechando. E quando a cabeça do gigante pendeu para a frente sobre seu peito, Hermes com um só golpe cortou o pescoço dele, e sua cabeça rolou por entre as rochas. Ó desafortunado Argos! a luz dos seus cem olhos se extinguiu imediatamente! Hera retirou os seus olhos e os colocou como ornamentos na cauda de seu belo pavão, onde eles permanecem até os dias de hoje.

Mas a vingança de Hera ainda não fora sacida. Ela enviou um moscardo para atormentar Io, que percorreu o mundo inteiro fugindo da sua perseguição. Ela atravessou o Mar Iônico, cujo nome tem nela sua origem, depois perambulou pelas planícies da Ilíria, subiu o Monte Hemo, além de cruzar o Estreito da Trácia, daí a sua denominação para o Estreito de Bósforo (que significa local para a vaca pastar), perambulou pela Cítia, e pela região dos cimérios, chegando finalmente às margens do Nilo. Por fim, Zeus decidiu interceder por ela, e diante de sua promessa de que não mais voltaria seus olhos para admirá-la, Hera permitiu que a sua forma original lhe fosse devolvida.

 

Foi curioso observá-la ao reassumir pouco a pouco a sua forma anterior. Os rudes pelos caíam de seu corpo, seus chifres encolheram, seus olhos foram ficando pequeninos, a boca diminuiu de tamanho; mãos e dedos surgiram no lugar dos cascos em suas patas dianteiras; no final nada restou da novilha, com exceção da beleza. No começo ela tinha medo de falar, com medo de se sentir humilhada, mas foi recuperando a confiança pouco a pouco, sendo devolvida à companhia de seu pai e das suas irmãs.


Informações sobre o Mito

O mito original foi escrito por Públio Ovídio Naso, mais conhecido apenas como Ovídio, um poeta romano.

Seus poemas são caracterízados pela sua aversão a figuras de autoridade, no caso de textos mitológicos ele retrata de forma critíca como os deuses brincam com a vida dos homens.

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